A Máscara de Cera – Capítulo 35

O fim de tarde tingia o sótão com um tom dourado e melancólico. Clara vasculhava as prateleiras altas, entre caixas desfeitas e panos que cobriam segredos. Seu olhar foi atraído por uma caixa de madeira pequena, ornamentada com entalhes circulares, quase como um sussurro visual. Ao abri-la, o ar pareceu mudar de temperatura.

Lá dentro, cuidadosamente envolta em linho envelhecido, repousava uma máscara de cera. Clara a retirou com delicadeza e sentiu o sangue esvair-se do rosto. A máscara era o retrato exato de sua própria face. Cada curva, cada traço, até a pequena cicatriz abaixo da sobrancelha esquerda. Era como se alguém a tivesse moldado enquanto ela dormia.

Mas algo na expressão da máscara a perturbava. Era o mesmo rosto, sim, mas os olhos cerrados carregavam uma tristeza que não era sua. Ou não deveria ser.

Ao tocar a superfície fria e suave da cera, uma vertigem tomou conta de seu corpo. O sótão escureceu, como se as sombras se adensassem. E então, as imagens vieram.

Um campo envolto em névoa. Um vestido antigo. Mãos que pintavam às pressas antes que a luz morresse. Um nome sussurrado ao vento. Elias. Uma despedida nunca dita. Um espelho sendo coberto. A sensação de ter deixado algo incompleto. E por fim, o reflexo de outro rosto no espelho. O seu. Mas com outro nome nos lábios.

Lisbeth.

A visão se desfez como um sopro em vidro frio, e Clara caiu de joelhos, ofegante, a máscara ainda entre os dedos. O sótão havia voltado ao normal, mas ela não era mais a mesma.

Agora havia lembrado de uma dor que não era sua e de um amor que parecia ter ficado esperando por ela. Entendeu que a máscara não era apenas um objeto.

Era uma memória moldada à mão.
Era ela.
Ou aquilo que precisou esquecer para continuar viva.

A Máscara de Cera – Capítulo 35